terça-feira, 25 de maio de 2010

A nova velha São Paulo

A nova velha São Paulo

Moro por essas bandas desde minha infância, mas só há pouco parei para refletir sobre a mudança das coisas por aqui. Lembro que todo domingo papai me levava para dar uma volta pela cidade, nunca entendi ao certo o motivo, sabia apenas que desejava que eu adquirisse um novo olhar sobre a nossa São Paulo, como costumávamos dizer.
Falava-me que, em seus tempos, não havia Shopping Centers, emocionava-se ao recordar a inauguração do Iguatemi, na década de 60. Lembranças vinham à tona quando o assunto eram os refrescantes e poéticos passeios no bondinho que passava pela Avenida Ibirapuera. Não me esqueço da primeira vez em que me arrastou ao Parque da Luz, pensava que era sinônimo de tráfico e prostituição, mas cri em suas doces palavras quando me alertou que seu passado era recheado de descontrações de crianças ou de encontros de casais e amigos.
As ruas não mais me assombravam e muito menos transportavam, passei a entender sua essência, sua alma. Papai narrava os mais belos contos de suas peripécias e de seus amigos na Avenida 23 de maio, desde quando ficaram presos no recém-inaugurado mercado Gunga-Din ao espetáculo da chegada da consagrada seleção de 70.
Contudo, não serão essas belas histórias que aprendi que repassarei aos meus filhos, ensinarei a eles que o importante não é se fazer notado, mas sim notar com um olhar crítico de cidadão a cidade que está a nossa volta, tentarei mostrar-lhes que se deve romper com as diversas barreiras sociais impostas, barreiras essas que julgam e que reprimem.
Se algo ficou destes passeios foi o ceticismo herdado de meu pai, passei a compreender o que realmente é ser cidadão de uma megalópole como essa em que a principal variável tornou-se o tempo, em que somos calados pelo sistema e onde a arte passou a ser o grito de liberdade. Chego a cogitar a sorte de Papai de não ter vivido tempos como estes, mal sabia ele que a sua história seria aos poucos apagada e que sua memória seria substituída por torres, edifícios e arranha-céus. Posso afirmar com precisão que essa não é a mesma São Paulo daquela dos contos que ouvia nos mais belos domingos.
Emociono-me até hoje ao lembrar, mas como enfatizava meu pai: “São Paulo que, a despeito do nome, de santo não tem nada”.
Rodrigo Lerner

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